As cidades e suas variadas histórias, infinitos ângulos e perspectivas, suas imbricações com trajetórias múltiplas e suas inscrições em corpos que por elas circulam são o mote do livro fundador de Renato Cordeiro Gomes, Todas as cidades, a cidade – literatura e experiência urbana. Em edição revista e ampliada, com prefácio de Eneida Maria de Souza e novo projeto gráfico, os ensaios do professor doutor em literatura comparada delineiam a cartografia da metrópole moderna a partir do encontro entre sujeitos e urbes, cidades e letras. Na primeira parte do livro, Cordeiro Gomes parte das metáforas do cristal e da chama criadas por Ítalo Calvino, capaz de “exprimir a tensão da racionalidade geométrica e o emaranhado das existências humanas”, em precisa definição do escritor italiano, para ler o ilegível do labirinto urbano. O labirinto, aliás, é outra metáfora explorada pelo escritor como símbolo do livro de registro da cidade, local no qual são guardadas suas histórias, imagens e lembranças, numa referência infinita a outros lugares e textos. O autor utiliza-se ainda de prática semelhante, quando, para escrever sobre Babel, visita textos de Franz Kafka, Walter Benjamin e Paul Auster. Na segunda parte do texto – “Suíte carioca” – Cordeiro Gomes aponta o ângulo de sua análise para uma única cidade, o Rio de Janeiro, através de textos de seus mais eminentes escritores. Destaca-se aí a abordagem da cidade múltipla e provisória, que precisa conviver com demolições para se transfigurar em moderna, sem conseguir, no entanto, esconder seus escombros e suas formas inacabadas. Como destaca o autor, apesar da tentativa de construir uma cidade planejada, estes autores revolveram o caos para dar forma à cidade verdadeira, múltipla e fluida, tal qual a superfície literária que tece em palimpsesto.