É véspera de feriado e a rodoviária está lotada de gente. Carlinhos tem em mãos uma passagem com destino a Santa Marta, cidade onde nasceu e para onde parte agora, já adulto. Na poltrona 27 – a mesma que costuma ocupar em sucessivas viagens –, ele será o observador atento de diversos personagens que deixam Belo Horizonte em direção ao interior de Minas Gerais, cada qual com um motivo, uma perspectiva. São homens, mulheres, jovens, senhores: os passageiros, em sua vida árida, enxergam no êxodo uma gama de oportunidades. E, sempre que podem, retornam à família, às bolinhas de gude, aos amigos, aos cavalos, à casa onde cresceram. São mineiros que, assim como Carlinhos, buscam uma nova terra para arquitetar a vida adulta, construindo assim dois mundos: o da maturidade e o da memória. Neste saboroso romance de Carlos Herculano Lopes, misto de ficção com autobiografia, o fio que conduz o ônibus através da rodovia BR-381 é a confidência. O balanço do trajeto convida para o ombro amigo, sempre disposto a ouvir as histórias do conterrâneo que viaja na poltrona ao lado. Essas histórias nem sempre têm um final feliz. É assombrosa a quantidade de acidentes que levam à morte na região, geralmente trazida pela correnteza do rio. Mesmo assim, marcados pelo otimismo, os passageiros não têm tempo para sentir tristeza. No lugar, sentem saudade.