Relato duro, mas intensamente poético, O homem é um grande faisão no mundo (1986) configura a rotina, entre desalentada e desejosa de mudanças, de sobreviventes de guerra numa aldeia da Romênia.
Para todos, o tempo está parado. Windisch, o guarda-noturno, diariamente carrega sacos de farinha até o moinho e conta os dias: quer deixar o vilarejo, rumo à Alemanha. Causando inveja, o peleiro obtém o passaporte; mas alçar voo da aldeia é também uma incógnita. Resignado, ele prefere ficar; é ele quem evoca o provérbio sobre o faisão que intitula o livro.
Aves medrosas, de asas curtas, os faisões, por outro lado, são vistosos. Já as fêmeas, discretas, têm porte menor. Tais diferenças se equacionam nos ataques de predadores: chamativo, o macho atrai para si o perigo, enquanto a fêmea foge com a cria.
Na obra de Herta, ganham forma as tensões entre homens e mulheres, as desconfianças e traições em relações amorosas marcadas por incomunicabilidade. Saltam à vista, naturalizados, a impossibilidade do amor, o trabalho explorado, a falta de ética em instituições como a Igreja e a polícia. Tudo sob a sombra da guerra e da ditadura.
A mosca pousa na lágrima da mulher de Windisch e voa com as asas molhadas. O amor só ocorre “no meio dos túmulos”, onde ambos choravam os namorados mortos. “Olhos sem o rosto”: Windisch sofre a dor de saber dos sacrifícios da filha em troca do passaporte para a família fugir. Uma macieira come as próprias maçãs. Essas são algumas das imagens poéticas criadas nesta obra, que, em sua concisão, traduz o vazio de vidas marcadas pela guerra.