Raízes, troncos e galhosNas religiões afro-brasileiras, aprendemos a reconhecer a importância do útero primordial – igbádù. Reverenciamos as Mães Ancestrais, figuras maternas que habitaram nosso mundo, antes mesmo de nós existirmos. Nossas mães, são nossas raízes.Em uma sociedade patriarcal, como a ioruba, cada divindade feminina é celebrada como uma rainha (áyàbá). Ìwá, o caráter, é personificado como uma mulher, no corpus da sabedoria de Ifá. No Brasil, nossas Casas Matrizes foram fundadas e soerguidas pelas operosas mãos de mulheres, expoentes da resistência sociocultural negra neste território. Não posso deixar de citar nossa querida Umbanda na qual, pedagogicamente, as Caboclas, as Pretas-Velhas e as Pombagiras, recebem um protagonismo ímpar, em uma sociedade que tentou, desde sempre, exatamente o apagamento desses segmentos representados por tais Entidades: indígenas, negros e o chamado povo de rua.E onde entram então os autores desse livro, os homens de Àşẹ? Antes de qualquer coisa, todos os homens, nasceram de uma mulher. São, portanto, rebentos, filhos; antes de serem pais. Este fato é, para nós homens, motivo de grande orgulho, uma grande dádiva. Somos, porque nos criaram, nos levaram no ventre, no colo, junto ao seio. Homens, são troncos que crescem apoiados por raízes.Os saberes vindos da África nos alfabetizam com a natureza, através da qual aprendemos a ver, falar, ouvir e a sentir. Nossa religião propõe, no culto à natureza, a busca de equilíbrio, a harmonização das forças que habitam em nós, com aquelas que existem entorno de nós. Nós, homens, portanto, integramos esse papel intersocial e interenergético. Os homens que escreveram este livro, são exemplos de personalidades que fizeram, fazem, e que ainda muito haverão de fazer e inspirar novas gerações. São frutos de mulheres, que souberam honrar seus lugares, seus legados. Os autores desta obra, são personagens inesquecíveis; heróis conscientes de sua missão, que, através de sua dedicação diária, fazem nossas religiões vivas, pulsantes, eternas. Desses troncos, se esticam galhos, ramificações, das quais se amplia a árvore dos nossos saberes.No Candomblé, os ancestrais também nos ensinam gratidão e reverência a quem veio antes: às mais velhas e aos mais velhos. Nossa palavra é, pois, gratidão (ìmoore). Gratidão às Mães, que são raízes. Gratidão aos Pais, que são troncos. Gratidão aos filhos, que são as ramificações. Somos uma só árvore, membros de uma só natureza.A dúpẹ́ fún máa wà! Agradecemos por existirem!Rio de Janeiro, 19 de setembro de 2022.Márcio de Jagun